A dependência aumenta sob Lula
Adriano Benayon* - 13.08.2003
A agenda estabelecida pelo Banco Mundial e pelo FMI (reformas tributária e da previdência, lei de falências) monopoliza a pauta da Câmara dos Deputados. Rolo compressor empurra goela abaixo do País a “reforma” da previdência. É a continuação do processo de desfigurar a Constituição, como se ela fosse um folhetim alterável a cada semana.
Isso
é terrível. Mas pior ainda é o Brasil afundar na depressão econômica e
encaminhar-se para novas crises nas dívidas interna e externa, enquanto os
poucos opositores se esforçam por atenuar os estragos decorrentes dos novos
privilégios das “reformas” em favor dos grupos concentradores. O script se
repete, com mais intensidade nos últimos 12 anos, desde a crise da dívida
externa, iniciada em 1979. A coisa
tende a ser infindável, a não ser que se dê um basta.
Nesse
transe, declara o ex-executivo do Banco de Boston, a quem foi entregue a política
monetária, que a inflação “ainda” não foi vencida, e assim não conviria
reduzir muito as taxas de juros. Ora, o
verdadeiro objetivo da atual política são os juros altos, graças aos quais
cada um dos bancos concentradores está tendo lucro líquido de R$ 2 a 3
bilhões por ano.
O
pretenso combate à inflação constitui mero pretexto. Ela nunca estará morta
no Brasil, enquanto o Estado não fomentar a produção, não voltar a investir
na infra-estrutura e não intervier nos mercados para suprimir as práticas
monopolistas e oligopolistas. A inflação é
impulsionada também pelos contratos
imorais e inconstitucionais com as transnacionais de serviços públicos
privatizados, cujos abusivos aumentos de tarifas são
autorizados pelas agências “governamentais”. Respeitar esses
contratos não passa de subserviência ao poder imperial.
Para
“justificar” a corrupta privatização da geração e da distribuição de
energia alegou-se não ter o Estado recursos para investir. Que aconteceu
depois? As transnacionais beneficiadas não investiram, acumularam prejuízos
mal explicados, e agora o BNDES gasta vultosos fundos públicos para socorrer
essas empresas.
Na
Argentina, o novo governo congelou as tarifas, e as transnacionais de
eletricidade e telefones demandam o governo argentino em tribunais
internacionais. Sinal de que não esperam ter êxito na Justiça do País.
Apesar de o curso do governo argentino não estar definido, só esse
congelamento faz com que Kirchner ganhe de dez a zero da caótica administração
implantada no Brasil.
Esta
só fez acentuar a depressão, até atrasando os pagamentos a fornecedores.
Depois de sete meses, a única coisa que alegadamente faz em sentido contrário
à queda da produção e do emprego
é favorecer as montadoras estrangeiras. O Executivo promove Plano Emergencial
para o Setor Automotivo, um "PROER”, que inclui renúncia fiscal (IPI e
ICMS), crédito especial, juros subsidiados e prazos de financiamento alongados.
As
alíquotas do IPI sobre veículos de passeio e comerciais leves, populares,
etc., foram reduzidas em quatro pontos percentuais por três meses. A partir de novembro
sobem um ponto, ficando com três a menos. Apesar do compromisso das montadoras
de repassar o benefício fiscal, o consumidor não tem garantia disso. As
empresas alegam possíveis elevações nos custos de insumos, como o aço, e o
dissídio coletivo previsto para novembro.
A
desculpa para favorecer as transnacionais é a chantagem de demitir
trabalhadores. Ora, elas foram premiadas por n subsídios, sob o
argumento de que criavam empregos. Mas,
transferindo ao exterior anualmente 20% do PIB, elas acarretam a perda de múltiplos
crescentes desses empregos. Depois
de ter ganho, desde sempre, fantásticos subsídios federais e de governos
estaduais, a General Motors ameaça deixar o Brasil (ou seria: promete?). Segundo
o presidente da empresa, ela está
com ociosidade média de 40% no Brasil e reivindica mais reduções e isenções
fiscais. Afirma que as empresas não podem operar durante muito tempo com prejuízos
e ociosidade, como vem ocorrendo no Brasil. Se nada for feito, diz ele, as
montadoras podem desistir de investir e até deixar o País.
Noutro
setor, a japonesa Furukawa Electric anunciou, em Tóquio, o fechamento da fábrica
de cabos ópticos em Campinas (SP), adquirida
da Lucent, em novembro de 2001. A Furukawa Industrial, controlada pela Furukawa
Electric e pela Mitsui & Co., mantém unidade em Curitiba (PR), da qual
demitiu 784, mantendo só 1.300.
Aí
estão casos típicos do modelo dependente, que a atual administração
intensifica. Nele as decisões dependem de centros situados no exterior. O
mercado regride e a competição desaparece. Não se desenvolve produção
alguma, e as que existem dependem de tecnologia estrangeira jamais absorvida.
Mais grave é a ascendência política das transnacionais, como ilustram também
outras lastimáveis decisões do Executivo Federal, tais como: 1) a autorização
para propaganda de fumo na Fórmula 1, proibida em vários outros países onde
ela faz corridas; 2) a liberação da venda de soja transgênica, sob pressão
da Monsanto.
*
- Adriano Benayon, Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo,
Alemanha.
Autor de “Globalização
versus Desenvolvimento”